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Relembrando as maiores tragédias causadas por incêndios no Brasil desde 2010

O fogo, força da natureza que aquece e ilumina, também é capaz de devastar vidas, patrimônios e memórias. Nos últimos 15 anos, o Brasil presenciou alguns dos incêndios mais marcantes de sua história recente, que deixaram feridas profundas em famílias, cidades e no imaginário coletivo. De casas noturnas a prédios ocupados, de museus a centros comerciais, a memória desses eventos continua a ecoar como alerta e homenagem às vítimas.

Incêndio nas Torres Gêmeas de Santa Tereza (Belo Horizonte, 2010)

Em 20 de setembro de 2010, um prédio inacabado, ocupado irregularmente por dezenas de famílias no bairro Santa Tereza, em Belo Horizonte, foi tomado pelas chamas. Conhecido como “Torres Gêmeas” ou Residencial Saint Martin, o edifício já acumulava problemas estruturais e ligações elétricas clandestinas.

O incêndio começou no sétimo andar e rapidamente se espalhou, colocando em risco cerca de 200 moradores. Graças à ação rápida do Corpo de Bombeiros, não houve mortes. Trinta pessoas que ficaram presas nos andares superiores foram resgatadas em meio à fumaça densa.

João Antônio de Carvalho Resende, bombeiro militar, que morava em frente ao prédio, foi um dos primeiros a chegar ao local, mesmo estando de folga. “Corri sem pensar duas vezes. Era minha vizinhança em chamas. Vi mães chorando pelas crianças presas e só pensei em ajudar. Aquela noite marcou para sempre a minha vida”, relembra.

Após o incêndio, a torre foi interditada e, nos anos seguintes, desocupada definitivamente. O episódio se tornou símbolo da luta por moradia digna e pela necessidade de fiscalização de prédios abandonados.

Tragédia da Boate Kiss (Santa Maria, 2013)

O incêndio mais devastador da história recente do Brasil ocorreu na madrugada de 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria (RS). Um show pirotécnico dentro da Boate Kiss provocou a morte de 242 jovens e deixou mais de 600 feridos.

O fogo e a fumaça tóxica tomaram rapidamente o espaço fechado, sem saídas de emergência adequadas. O país inteiro acompanhou, estarrecido, o resgate e os funerais coletivos que se seguiram.

Em depoimento emocionado, o pai de uma das vítimas, Adherbal Ferreira, disse à imprensa na época: “Perdi meu filho, mas não posso deixar que ele tenha morrido em vão. Precisamos mudar as leis, precisamos de fiscalização. Essa tragédia não pode se repetir.”

A tragédia da Kiss gerou mudanças legislativas sobre segurança em casas noturnas e segue lembrada em memoriais e atos anuais na cidade.

Museu Nacional em Chamas (Rio de Janeiro, 2018)

Na noite de 2 de setembro de 2018, o Brasil assistiu, incrédulo, às chamas que consumiram o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, guardião de mais de 20 milhões de itens históricos e científicos.

O incêndio destruiu grande parte do acervo, incluindo fósseis, registros indígenas, peças arqueológicas e coleções únicas. O episódio foi considerado uma tragédia cultural de dimensões incalculáveis.

A pesquisadora Cláudia Rodrigues, que trabalhou no museu por 15 anos, declarou: “Não perdemos só objetos, perdemos nossa memória, nossa identidade. Foi como assistir parte da história do Brasil virar cinzas diante dos olhos.”

Desde então, projetos de reconstrução têm avançado lentamente, com apoio internacional, mas a perda permanece irreparável.

Hospital Badim (Rio de Janeiro, 2019)

Em 12 de setembro de 2019, um incêndio no Hospital Badim, no Maracanã, Rio de Janeiro, deixou 22 mortos, a maioria pacientes em tratamento. O fogo teria começado em um gerador, espalhando fumaça tóxica pelo prédio.

O episódio escancarou falhas em planos de evacuação hospitalar e a vulnerabilidade de pacientes impossibilitados de se locomover.

Uma técnica de enfermagem, que ajudou a retirar doentes das UTIs naquela noite, disse ao G1: “A gente corria contra o tempo, carregando macas e cadeiras de rodas no escuro. Nunca vou esquecer os gritos e o desespero.”

Após o caso, o Conselho Regional de Medicina do Rio reforçou protocolos de emergência em hospitais.

Cinemateca Brasileira (São Paulo, 2021)

Em 29 de julho de 2021, o maior acervo audiovisual da América Latina foi atingido por um incêndio que destruiu rolos de filmes históricos e documentos da Cinemateca Brasileira, em São Paulo.

O descaso com a preservação cultural voltou ao centro do debate. “Foi como perder nossa memória cinematográfica. Obras raras, que não têm cópias digitais, se foram para sempre”, lamentou a diretora de cinema Tata Amaral em entrevista coletiva.

O caso acendeu debates sobre investimentos em cultura e preservação do patrimônio.

Outras ocorrências marcantes

Além desses casos emblemáticos, o Brasil registrou outros incêndios impactantes:

  •   O incêndio no Edifício Wilton Paes de Almeida, em São Paulo (2018), levou ao colapso do prédio ocupado por famílias.
  •   As chamas destruíram parte da Ala Infantil do Hospital Federal de Bonsucesso, no Rio de Janeiro (2020).
  •       E os frequentes incêndios em áreas da Amazônia e do Pantanal, que devastaram ecossistemas inteiros e ganharam repercussão mundial.

Memória, lições e homenagens

De 2010 a 2025, o Brasil testemunhou como incêndios: em moradias precárias, casas de espetáculo, hospitais e instituições culturais, podem revelar fragilidades estruturais, negligências históricas e a falta de prevenção.

As palavras do bombeiro João Antônio Resende, de Belo Horizonte, ecoam como síntese da missão dos profissionais que enfrentam o fogo diariamente: “A gente entra para salvar vidas, mesmo sabendo dos riscos. O incêndio passa, mas a memória do que vimos e vivemos nunca se apaga.”

Relembrar essas tragédias não é apenas revisitar a dor, mas reforçar a importância da prevenção, da fiscalização e do investimento em segurança. É também um ato de homenagem às vítimas, aos sobreviventes e aos heróis anônimos que, em meio ao caos, escolheram salvar vidas.

 

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