Na esfera social, faz parte da evolução e da democracia o registro de queixas que buscam o atendimento de demandas relacionadas às políticas públicas e aos direitos individuais e coletivos. É evidente que, em uma sociedade de classes, isso atravessa os interesses de cada classe, passando pelo poder de um parlamento burguês e fundamentalista.
No processo analítico, Freud destacou a importância de um “tratamento de ensaio”, que Lacan denominou como entrevistas preliminares, com o propósito de acolher queixas para uma transformação: a demanda de análise. A partir daí, surgem implicações com perguntas específicas do analisando diante dos sofrimentos psíquicos: por que repito relações abusivas, comportamentos compulsivos, ou trabalhos infelizes?
Além da escolha de uma atuação profissional que atenda ao princípio básico da realidade, que é o sustento, temos algo mais importante que é o desejo: a vocação, que é sintomática e está alinhada ao ofício. Escolhas importantes passarão pelas mudanças ideológicas que almejamos e também exigem uma avaliação e implicação, especialmente num ano eleitoral: meu candidato cumpriu minhas expectativas, pelo menos em parte? Que outras opções terei se me decepcionar? O que motivou minha decisão de voto: um cargo, o desejo influente de alguém?
Neste momento delicado de transição, com esforços hercúleos do governo Lula para enfrentar o fascismo, que não está adormecido, qualquer queixa que seja relevante para o avanço requer cautela. Não pode a crítica se transformar em uma demanda para desqualificar e enfraquecer a correlação democrática que desalojou o bolsonarismo, revertendo votos para eles. Como diz o ditado popular: “Roupa suja se lava em casa”.
Na dialética da luta de classes, é bom lembrar que a democracia é baseada no desejo da maioria. Portanto, enfrentamentos mais amplos, como não querer pagar mais impostos pelos poderosos, não são pertinentes.
No campo dos direitos sociais e humanos, temos a luta permanente pela “fome zero” e pelo fim da violência contra mulheres, negros, LGBT+. Para isso, não basta apenas a vontade política dos governos, mas também a atuação dos movimentos populares, em colaboração com áreas como saúde, segurança e, principalmente, educação.
Se, no exercício da democracia, continuamos a ensaiar, no divã, apostamos que, na livre associação, as demandas do sujeito do inconsciente, desejante, vão se organizando para além do simples queixume.