Em um país como o nosso, no qual o futebol é uma marca, não jogar bola é um drama para qualquer guri na socialização, desde a infância. Eu passei por isso, pois era muito tímido, mais próximo do universo feminino de minhas irmãs, mas busquei um lugar como goleiro, de certa forma era de maior proteção, em todos os sentidos.
Estas reflexões partiram da instigação de meu Editor da Real News de Canoas, o jornalista Wagner Andrade. Ele aprendeu a respeitar e valorizar as mulheres por ter sido criado por uma delas. Enquanto narrador de futebol, entende que as mulheres podem ser também ótimas narradoras, mas para tal função também são discriminadas. O preconceito vem ainda, segundo o jornalista, das empresas de mídia, numa suposição de que a torcida não vai gostar de mulher nesse lugar.
Subjetivamente, eu sempre achei um paradoxo: é que o ambiente futebolístico, sobremaneira, é opção em conviver muito tempo entre homens. E a homossexualidade é favorecida com isso, não determinante, claro. As trocas de afetos em comemorações são muitas vezes calorosas, sensuais e nada tenho contra. Existe um amor-amigo, fiel, como foi o caso clássico quando Renato deixou uma copa em solidariedade ao seu parceiro, Leandro.
A coragem que deve ser demandada é a todos nós: que em algum nível somos estruturados pela cultura patriarcal. Pela palavra de ordem Dalmareana, “menino veste azul, menina veste rosa”.
A misoginia machista foi um dos motivos do golpe do Impeachment de Dilma, boicotada com pautas-bomba, engavetadas e pressionada pelos “machos” poderosos a ser flexível com as demandas sociais. Estamos vendo o quanto o machismo também é responsável pela castração, por parte da Câmara Federal de Poder, segundo Sonia Guajajara, no Ministério dos Povos Indígenas. O mesmo acontece com o Ministério do Meio Ambiente, sob o comando de Marina Silva.
O machismo e todos os preconceitos levarão muito tempo para serem desarticulados. O que nos dá esperança é que, na retomada da democracia, a militância contra eles tem lugar de fala mais respaldado pela frente que está com Lula no governo. Escutar um homem heterossexual se queixando do machismo é entusiasmante, libertário. Sim, pois a postura machista patriarcal, definindo papéis sociais que se refletem na cama, limita todos nós a um maior prazer, maiores trocas com respeito e desconstruindo o binarismo que atribui masculino e feminino como restrições de gênero e/ou orientação sexual.
O desejo de amar é de uma ordem para além dessas limitações. Nós, psicanalistas, devemos acolher quem faz sintoma e sofre por isso, na busca de uma felicidade possível, nas escolhas de parcerias afetivas e em todos os campos, sem machismo, seja no futebol, no trabalho ou na política, com uma nova narrativa libertária.