A política entrou de vez na rotina de conversa dos brasileiros, o surgimento expressivo de pessoas que se identificam como a direita brasileira surpreende tanto no mundo virtual quanto no real. A paixão política antes exercida explicitamente pela esquerda brasileira, principalmente na órbita do PT-Partido dos Trabalhadores, através da figura do Ex-presidente Lula, símbolo de esperança para a classe trabalhadora no pós 1988, era muito mais comum. Muitos comícios embalados por artistas, cantores e pensadores arrastaram uma multidão de pessoas que atendiam o chamado das lideranças petistas sobre forte coro de palavras de ordem e bandeiras vermelhas.
As manifestações mais recentes têm ficado por conta do mar de gente que acompanha o atual Presidente Jair Bolsonaro, que resgatou um público conservador e alinhado com um discurso nostálgico dos últimos governos militares. Com um verdadeiro exército de simpatizantes e seguidores, Jair Bolsonaro nas redes sociais e no mundo real tem êxito considerável, em todas suas manifestações públicas, de forma espontânea o povo tem seguido e acompanhado os “comícios”.
Controvérsias à parte, o fenômeno da polarização da política brasileira é novidade? Há quem diga que sim, uma vez que nos governos militares os partidos de matriz esquerda como PCB e PCdoB e mesmo os menos radicais, vide MDB – com grupos internos mais radicais, como o movimento MR8 por exemplo – viviam na clandestinidade, criando desde a década de 60 militantes e lideranças, alguns no cenário político até hoje.
O período foi marcado por ações da militância de comunista/socialista/revolucionária, em contraponto às ações dos militares que ocupavam os governos na época. Os militares aplicavam medidas como restrições de reuniões e associações, censura em várias frentes, perseguição a lideranças civis, torturas a membros de grupos revolucionários – Esses institucionalmente classificados como criminosos. Os personagens revolucionários históricos, heróis para alguns, protagonizaram inclusive tentativas de lutas armadas, já pelos militares as ações restringiam cada vez mais organizações, que contrariavam as políticas governistas e o status quo daquele período. A história é bem mais ampla e merece análise mais profunda e detalhada, mas em síntese é isso. Conhecer a história do período 1964-1985, que antecedeu a “redemocratização“, com a constituição promulgada em 1988, é fundamental para nós entender a atual situação política do Brasil.
Sem entrar no mérito das muitas versões sobre esse período, o fato é que houve contribuições para o desenvolvimento do país por ambos os lados, os militares desenvolveram o Brasil conforme necessidades do período, criando a estrutura que ainda hoje existe (com falhas e acertos) que na memória de algumas pessoas – saudosistas – defendem o período como referência de bom governo, esse período ficou marcado pela gestão de alguns personagens históricos como: Medici (1969-1974), Castello Branco (1964-1967), Governo da Junta Militar (31/8/1969-30/10/1969), Costa e Silva (1967-1969).
Há igualmente (dada as devidas proporções) a contribuição de lideranças contrária ao governo militar, que teve grande contribuição para o desenvolvimento de parte do povo, principalmente no sentido crítico, questionando e desenvolvendo pessoas, incentivando a busca por direitos. A luta revolucionária foi marcada por mortes, torturas e personagens que ficaram na história do país como, Vladimir Palmeira, Luís Carlos Prestes, Carlos Marighella e o jornalista Vladimir Herzog morto no DOI-CODI de São Paulo, este criando uma necessidade de investir na legislação para proteção da imprensa e jornalistas.
Feito esse simplório resgate histórico (…), voltamos ao presente, onde a polarização tem ocupado os espaços de reuniões livres, as primeiras páginas de jornais livres, imprensa livre, manifestações com liberdade de expressão, a herança do período do governo militar e dos muitos opositores nos possibilitou debater de forma aberta a questão política de hoje. Nesse sentido, independente da opinião de cada um, é infinitamente melhor ter as opções, que não ter escolha. O que falta é dar um passo à frente, evoluir, em relação a cultura política e conhecimento mais amplo, no sentido que o povo no geral deve entender o sistema político, a estrutura do Estado, a história do Brasil, assim se valorizar e priorizar o Estado e não as pessoas.
No geral, os conflitos e clima de Gre-Nal, são fruto das paixões por pessoas e ideologias, que criam ídolos e símbolos falhos, causando frustração no eleitor que não tem sua expectativa atendida; é preciso transformar a “nossa gente” em um povo com noção de cidadania, fato que demanda muito trabalho, conhecimento, paciência e investimento principalmente em nossos jovens.
Atualmente as muitas discussões, às vezes mais acaloradas, tem focado em dois personagens, literalmente, porque ambos só podem ter criado personagem e estão vivendo 24h assim, Lula e Bolsonaro, são fruto de uma manifestação popular, são herança da apropriação de segmentos; por um lado, Lula, que surgiu como representante do mais pobre e da classe trabalhadora, insistindo em pautas como pobreza, fome, moralidade política, racismo e lutas de classe, desde sua primeira eleição, após quando eleito, foi surgindo/criando cada vez mais pautas de lutas e classes, ao longo de seus governos, contudo o Ex-presidente Lula está longe de viver como um socialista raiz, assim como críticos de seu próprio partido ou seguimento ideológicos, apontam o afastamento do líder e do partido de suas origens e filosofia.
De outra banda, surgiu Jair Bolsonaro, resgatando as viúvas e órfãos do regime militar – no sentido de simpatizantes daqueles governos, o atual presidente conseguiu demonstrar qual a verdadeira face do povo brasileiro, com tendências opressoras, conservadora, violenta e com seleção de privilégios. O fenômeno de Bolsonaro reuniu pautas antes discretas ou distantes, uma grande fração da sociedade se identificou com símbolos e pessoas que sustentam discursos de intolerância contra criminosos – que é diferente de intolerância contra o crime – temas como religião, educação militar, privatizações ou liberalismo econômico. O fato é, que o brasileiro médio se identificou com essas pautas, logicamente, ao contrário Jair Bolsonaro jamais chegaria ao palácio do planalto, somado a isso a decepção com a fé depositada em Lula, em relação a um governo popular voltado para o trabalhador, que de fato nunca existiu.
A Verdade é que em todos os casos a pobreza e ignorância de parte da população, é mais exaltada por políticos que se alimentam e se mantém no poder por essa causa. Alimentar a pobreza em todos os sentidos é deixar o país estagnado, criando ao longo dos anos personagens como Lula e Bolsonaro que são igualmente herança dos governos militares e possuem e alimentam aquele conceito de “nós contra eles”. Assim ficamos à mercê desses conflitos e debates sem fim, aguardando que o povo como nação entenda a necessidade de atualizar a política através da mudança dos personagens, pois o cenário, figurino, direção podem mudar, mas se os personagens são os mesmos, continuaremos assistindo as mesmas tragédias.