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O calor e suas implicações

O calor apocalíptico que estamos vivendo, além de gerar queixas generalizadas, leva-me a associações e reflexões integradas, como defensor dos direitos humanos, psicólogo social e psicanalista.

Como psicanalista, tomando a teoria em extensão, lembro que Lacan dizia que, diante do Real, nossos sintomas aparecem. Isso também se aplica ao Estado neoliberal, que se disfarça de keynesiano quando o governo estadual impõe a volta às aulas em uma rede de ensino que não oferece condições saudáveis nem cognitivas favoráveis ao aprendizado e ao trabalho de professores e demais docentes em meio ao calor extremo.

O argumento da SEDUC é a falta de “margem de adequação” para lidar com possíveis problemas no ano letivo. Ora, o calor insalubre, por estar no início do período escolar, não conta? Felizmente, para reduzir danos, o próprio clima deu uma trégua.

Nessa lógica de “acaloramentos”, fiz coro à deputada estadual Laura Sito (PT), que sofreu ataques racistas da extrema-direita por apontar os avanços do governo Lula, inclusive na questão alimentar. Sobrou ataque para mim também ao buscar uma visão holística diante das críticas dos bolsonaristas ao discurso de Lula, que incentivou a mobilização popular para boicotar preços abusivos.

É evidente que esse tipo de ação não representa um ato neoliberal de lavar as mãos diante das lutas hercúleas para equilibrar o arcabouço fiscal com projetos sociais. Temos controle inflacionário, aumento real do salário mínimo e queda no desemprego. Essa amplitude, porém, mentes pequenas, indutivistas e presas a fake news não conseguem alcançar. Não entendem que aqui há um nexo entre questões ambientais, estiagem, calor e preços dos alimentos.

Os mesmos que ignoram os estragos herdados de seu “mito” agora, de forma delirante, adjetivam o momento atual como “desgoverno”, querendo um “Lula mágico”. Desconsideram que, segundo o IBGE, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) teve um histórico recuo desde o Plano Real, ficando em 0,16% em janeiro, o que indica desaceleração da inflação e previsão de queda nos preços dos alimentos nos próximos meses.

Em momentos de crise e demandas urgentes, a nação sempre é convocada a fazer sua parte. Lembram dos “fiscais do Sarney” em tempos de mega-inflação? Recentemente, o grande protagonista solidário foi o voluntariado, que mitigou os efeitos da tragédia político-ambiental que resultou no parcelamento da dívida do estado e em uma ajuda de 100 bilhões de reais. E os fascistas não enxergam isso!

Sujeitos solidários, com desejo e empatia, fazem sua parte. A propósito, trago uma campanha: congelem galões de água e levem-nos às pessoas em situação de rua — um gesto que custa apenas boa vontade. E viva o projeto do vereador Giovani Culau, que propõe a liberação dos trabalhadores que atuam nas ruas em dias de calor extremo, em benefício da saúde física e mental!

Um calor saudável vem da indignação e da lucidez. Mas o que vemos é uma gestão em Porto Alegre que apoia a especulação imobiliária e os desmatamentos, como o abate de mais de 200 árvores no Parque da Harmonia, tornando-o um deserto, uma das ilhas de calor que já ultrapassam os 50 graus. No entanto, por narcisismo e interesses mesquinhos e imediatistas, é mais fácil culpar novamente o clima.

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Gaio Fontella
Gaio Fontellahttps://realnews.com.br/category/opiniao/blog-do-gaio/
Gaio Fontella (Psicólogo, psicanalista, graduado e pós-graduado pela UFRGS, comentarista e produtor do “Café com Análise”, no Youtube.
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