Infelizmente, mais uma vítima da depressão e isolamento é contabilizada. Esse assunto tão pesado e dolorido deve ser mais ampliado e divulgado, os números de suicídios por jovens e jovens adultos são assustadores. Em algum lugar perdemos a empatia uns com os outros e estamos no limite de naturalizar algo tão grave e tão sério. A perda de uma vida, seja qual for, próximo ou não de nós, é a perda de uma possibilidade para o mundo, pois quando uma luz se apaga no mundo, perdemos uma oportunidade de esperança e mudança para todos. Não é difícil conhecermos famílias que perderam pessoas para depressão, em muitos casos com o suicídio como instrumento da vitima.
A atenção com tema é abordado em campanhas, meses com sua respectiva cores de atenção (Setembro Amarelo), contudo o problema é silencioso e personalíssimo, e deve ser abordado nos primeiros sinais de isolamento do indivíduo. Em nossos tempos a doença virou quase uma pandemia devastadora, causada por infinitos motivos, do isolamento social à baixa estima que tomou conta principalmente dos mais jovens.
A verdade é que estamos cada vez mais distantes, presos em rotinas que não atendem a saúde física e mental, jovens isolados em uma bolha digital, que confundem as perfeições dos filtros digitais de redes sociais, com a realidade da vida prática. O culto ao corpo, a plastificação de imagens reais, incrivelmente confundem a juventude com pouca ou nenhuma experiência empírica de vida.
A família já não tem mais tanta relevância, em certas classes sociais é inclusive ridicularizada, deixando uma geração toda sugestiva ao modismo e influências de mídias perversas. Pode parecer mais do mesmo, esse tipo de sustentação, mas a realidade é que a falta de vínculo e aproximação entre as pessoas e às vezes dentro de casa, gera um sentimento de solidão. Também muitas vezes a insegurança natural da adolescente, bombardeada com uma apelação sexual e perfeição estética, fazem com que essa insegurança resulte em uma depreciação de sua própria imagem, sendo que os filhos não buscam mais os pais para o diálogo, e sim as redes sociais, um ambiente perigoso, onde a critica é sempre acompanhada com negatividade.
Em 2017, um trabalho da Secretaria de Estado da Saúde Centro Estadual de Vigilância em Saúde, apresentou um balanço ( disponível neste link, https://ifrs.edu.br/canoas/wp-content/uploads/sites/6/2019/09/Apresentacao-sobre-dados-epidemiologicos-do-suicidio-no-RS.pdf ), já apresentava números e dados preocupantes e alertava para o agravo motivado principalmente pelo isolamento social de jovens e idosos. Atualmente, uma recente pesquisa disponível no ministério da saúde, verificou que os estados da região Sul registram 23% do total de casos no Brasil, sendo o RS com maior número de casos, segundo dados do Ministério da Saúde. Ignorar esses dados é perigoso.
Como exemplo pessoal, há poucos dias, me despedi de um amigo que fez parte de minha infância, mais uma pessoa que foi absorvida pelo sistema e sucumbiu ao isolamento. João (um nome fictício), era um daqueles casos de grande potencial, lembro dele desde os meus primeiros dias de escola, no pré! Éramos amigos, durante toda aquela fase, uma criança prestativa, curiosa e cheia de assunto, lembro de quando ficávamos depois da aula para ajudar a tia da merenda lavar a louça, aquelas canecas azul, que não adiantava lavar o cheiro de milk ou café com leite nunca saia! ficamos ajudamos e comemos de tudo que tinha na dispensa. Durante muito tempo João foi meu melhor amigo, a tia dizia que nós éramos o arroz e feijão da escola, de uma forma tão carinhosa e divertida, que adorávamos aqueles apelidos – longe de hoje em dia que pode parecer pejorativo ou ofensivo – crescemos e continuamos a dividir a mesma escola, o glorioso Sete de Setembro, ainda nos tempos das 4 árvores de peras na entrada do portão.
Nunca fomos atletas, populares ou referência na escola, éramos alunos bem comum, ainda brincávamos na terra de carrinho no recreio, às vezes jogava “tampicross” (isso mesmo, aquelas pistas feita na terra onde os carrinhos era tampinhas de garrafas), João tinha boas tampinhas, lembrando agora é essa imagem que guardo dele, ele falando das suas tampinhas e se exibindo que uma das tampinhas era importada (risos), quem além de uma criança contaria uma besteira dessas, uma tampinha importada! Boa lembrança, foi como lembrei quando soube de sua partida.
A fase adulta chegou, estranhamente conforme crescemos, ficamos um pouco mais distantes, talvez porque quando crescemos, achamos ficamos menos acessíveis. Depois de anos, só via o João de vez em quando, passando na rua, nos cumprimentava de forma tímida, nada daqueles abraços de quando éramos crianças – isso faz falta para as pessoas. As coisas mudam e não notamos, nos afastamos das pessoas, as rotinas nos divide e nos prende em uma bolha, as dificuldades que a vida nos impõe não permite que tenhamos convivência social sadia, não conseguimos saber o que realmente se passa com pessoas próximas. A aparência nem sempre reflete o sentimento de alguém, às vezes pessoas próximas estão distantes e aflitas, muitas vezes dentro de nossas casas ou em nosso ciclo de convivência.
Quando se perde alguém vítima de suicídio, sempre nos questionamos “o porquê”, ou “mas ele(a) parecia tão bem”, a atenção com as pessoas deve ser uma rotina em nossas vidas, a empatia mudará o mundo para melhor, dispor de mais tempo para a família, prestar atenção nos filhos, companheiros e companheiras, estar presente e mostrar que está presente! Perguntar, ouvir, elogiar, dividir experiências, conversar pessoalmente e não deixar ninguém sozinho é fundamental, estar conectado com mundo na tela da Internet, nem sempre significa que está acompanhado/socializando, precisamos de terra firme também. O mundo real, fora da web, é muito mais interessante, sabemos disso, só não conseguimos mais perceber.
Nos primeiros sinais de isolamento, devemos fazer o possível para trazer de volta a pessoa, buscar ajuda com profissionais se preciso, se às rotinas e sistema nos divide e isola, devemos nos unir, buscar informações e não ter medo de pedir auxílio, estudar sobre o assunto é fundamental, os cuidados com crianças e adolescentes deve ser redobrado. Conforme o Psicólogo João Riegel, o assunto é de suma importância e a atenção com adolescentes deve ser dobrada, pois trata-se de uma fase delicada e de altos e baixos, recomenda a leitura do livro “Identidade, juventude e crise” do autor Erik H. Erikson.
A também psicóloga Gabriela Larsen também alerta para a atenção com crianças.
“Depressão infantil os sintomas podem variar de acordo com a idade. Alterar as questões comportamentais, o pensamento e os comportamentos até mesmo a fisiologia da criança pode se manifestar por vezes em sintomas clínicos ou por isolamento e choro excessivo.
Dificuldade de aprendizagem, dificuldade nas relações entre os pares e a família.
As crianças e os adolescentes podem apresentar agitação e hiperatividade distúrbio de apetite e alterações de sono como também a ansiedade e principalmente perder o prazer em ir à escola e brincar com brinquedos que antes tinham satisfações.
As crianças e os adolescentes podem apresentar também pensamentos negativos como se a vida fosse toda dá errado com você não tivessem interesse na diversão e nos objetos lúdicos apresentando baixa autoestima dores físicas sentimento de rejeição irritabilidade e tristeza profunda.”
O alerta é sempre importante, precisamos estar mais atentos a detalhes e estar dispostos a ajudar e ouvir as pessoas. Não podemos mais perder familiares e conhecidos, meu amigo o melhor jogador de tampicros da 2º série, dono da tampinha importada, ele deixou boas lembranças e fará falta, talvez só precisava saber que não estava sozinho, assim como muitos perto de nós.