Vamos trabalhar o conceito de masoquismo com um olhar da psicanálise, estendendo-o ao social, articulando-o com aspectos pulsionais e as repetições de escolhas que nos conduzem à vida, ao prazer saudável ou à destruição em diversos aspectos.
O masoquismo, inicialmente conceituado pelo psiquiatra da Universidade de Viena, Richard von Krafft-Ebing, em Novas Investigações no Domínio da Psychopatia Sexuali, demanda mais estudos para os interessados. Ao cotejar com o viés freudiano, percebemos que o masoquismo, na fantasia, tem suas bases no recalque e na sexualidade infantil, nas fixações, nas culpas edípicas e nas cicatrizes que aparecem sintomaticamente nos neuróticos.
Freud avançou conceitualmente ao postular que o masoquismo é um desdobramento do sadismo ativo, transformando-se em uma postura de passividade na qual o sujeito volta a agressão para si mesmo. Isso tem uma normalidade na conduta infantil “perversa polimorfa”, em que as pulsões parciais agem livremente.
A fantasia de espancamento foi observada como recorrente nas narrativas dos analisandos de Freud. O masoquismo feminino, com uma carga alta de excitação ligada ao pai, surge como uma saída do Complexo de Édipo. Nos meninos, essa excitação ocorre com a mãe, de maneira semelhante, ainda que de forma masturbatória e ocupando a posição feminina.
Na análise freudiana dos sonhos de guerra e suas repetições, Freud passa a ver o masoquismo como um prazer não reconhecido como tal, no qual a pulsão de morte domina.
Com base nessas premissas, podemos hipotetizar, no campo político e social, o motivo pelo qual muitos repetem escolhas nocivas e desamparadoras. O masoquismo não se restringe à sexualidade; ele se estende também à moral e ao comportamento.
Sendo um aspecto perverso presente em todos nós, em diferentes níveis dependendo de como o Complexo de Édipo foi resolvido, o prazer em sofrer encontra substitutos nas escolhas. Assim, não é descabido pensar que o masoquismo está em jogo ao se colocar um voto na urna, anuindo com um amor distorcido, como uma criança que se apega a quem a maltrata.
Recentemente, como nação, apostamos na vida ao derrotar o bolsonarismo com sua pulsão de morte em todos os aspectos. Agora, enquanto nosso estado e nossas cidades buscam reconstruir-se após a catástrofe política e ambiental, eleger novamente aqueles que nos desampararam beira ao masoquismo — um prazer nos maus-tratos, escondido no ilusório discurso de “um pai que bate por amor”, descolado da realidade da destruição causada.
É evidente que a campanha eleitoral envolve um processo de subjetivação que pode dissimular a verdade, promovendo a negação de que “tudo ficou melhor”, enquanto se esquecem alagamentos, imprudências e lutos de toda ordem. Os “currais eleitorais modernos” operam com barganhas, promessas antigas não cumpridas, maior tempo de exposição na mídia e fundos eleitorais mais robustos.
A aposta, nesta reta final, é na pulsão de saber, associada à de vida, para discernir quem pode governar com ética, eficácia, trabalho firme e competente pelos direitos humanos e comprometimento no cuidado com o meio ambiente cuja destruição potencializou as demandas da população por saúde integral, moradia, segurança, transporte e educação com qualidade.