A confiança da população nos gestores públicos é construída, acima de tudo, pela coerência entre discurso e realidade. Quando um gestor se propõe a expor uma situação grave, como a falta de insumos em um setor essencial, espera-se que a narrativa seja acompanhada de provas claras e irrefutáveis. Contudo, quando as evidências apresentadas não sustentam a versão comunicada, a credibilidade se perde e a administração pública é colocada sob suspeita. É o caso de Airton Souza, prefeito de Canoas.
Recentemente, um caso ilustrou essa problemática de forma contundente. Fotos divulgadas para demonstrar prateleiras supostamente vazias chamaram a atenção pela inconsistência. Enquanto o foco estava na ausência de materiais essenciais, detalhes ao fundo da imagem mostravam caixas de insumos que não foram devidamente escondidas.
CONFIRA

A situação se agravou quando, dias depois, novas imagens foram divulgadas mostrando as mesmas caixas reorganizadas, sugerindo que os materiais sempre estiveram disponíveis, mas haviam sido mal apresentados ou propositalmente ocultados na tentativa de reforçar um cenário de crise.
Veja a foto com as caixas de insumos

A sequência de eventos levantou questionamentos importantes sobre a veracidade das informações e a intenção por trás da divulgação inicial. Foi um erro de comunicação ou uma estratégia deliberada para manipular a percepção pública? Independentemente da resposta, o fato é que a falta de coerência gerou desconfiança e abriu espaço para críticas legítimas à gestão.
Além das contradições visuais, o caso trouxe à tona uma questão ainda mais grave: a aquisição de insumos sem licitação, realizada em caráter emergencial. Embora a legislação permita exceções em situações de urgência, tais transações exigem total transparência, com comprovação do motivo da dispensa de licitação e a devida emissão de empenhos para registro público. Cadê o empenho desta compra? A ausência dessas informações cria dúvidas legítimas sobre o uso correto dos recursos públicos e a organização administrativa da gestão.
A tentativa de demonstrar uma crise acabou se tornando um problema ainda maior. A população, ao perceber as inconsistências nas imagens, foi levada a questionar não apenas o caso específico, mas a capacidade de Airton Souza de liderar com responsabilidade. A confiança pública é um ativo valioso, e perdê-la, seja por falta de preparo ou por escolhas duvidosas, compromete a capacidade de governar de forma eficiente e transparente.
Quando gestores optam por dramatizar problemas ou criar narrativas pouco fundamentadas, o impacto vai além da controvérsia momentânea. Situações como essa reforçam a desconfiança da população em relação às instituições públicas e enfraquecem o debate sobre questões reais que precisam de solução. Se havia falhas na gestão de insumos ou dificuldades operacionais, elas deveriam ter sido abordadas com clareza e transparência, sem recorrer a artifícios que fragilizassem ainda mais a relação entre governo e sociedade.
A pergunta que fica é: por que recorrer a uma narrativa inconsistente se a verdade, por mais difícil que seja, é sempre o caminho mais seguro? Seja para expor dificuldades ou para justificar ações emergenciais, o papel do gestor público é fundamentar suas decisões com dados sólidos e comprováveis. A população merece mais do que discursos impactantes ou fotos cuidadosamente enquadradas – ela merece respeito, transparência e comprometimento com a verdade.
Ao final, o que poderia ter sido uma oportunidade de demonstrar comprometimento com a solução de problemas reais tornou-se um exemplo de como a falta de planejamento pode transformar uma tentativa de impacto político em um tiro no pé. A lição que fica é clara: confiança se constrói com verdade, e quando essa verdade é posta em dúvida, os maiores prejudicados são os cidadãos que dependem de uma gestão pública eficiente e ética.