Brasil, Peru e os golpes democráticos

A reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a presidência do Senado, apoiado por Lula e aliados, contra o candidato bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN) deu um alívio às forças democráticas e progressistas. O mesmo pode-se dizer sobre a reeleição de Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara? O tempo dirá. Esperamos que tipos como Eduardo Cunha e seu impeachment (golpe) pedalado por interesses escusos não nos assombre mais.

Falando em “golpes democráticos”, o nosso vizinho Peru está mais do que assombrado por um. O ex-presidente Pedro Castillo foi cassado e preso depois de uma tentativa de dissolver o Congresso peruano, que vinha tentando removê-lo da presidência desde que assumiu, há 16 meses atrás, eleito numa disputa apertada contra a filha do ex-presidente e atual presidiário, Alberto Fujimori, a extremista de direita Keiko Fujimori.

O que muitos não sabem é que a Constituição peruana permite que o presidente dissolva o Congresso, no artigo 134: “O Presidente da República tem o poder de dissolver o Congresso se este tiver censurado ou negado sua confiança e deve convocar novas eleições em até 4 meses”. Castillo se valeu de dois pedidos anteriores de impeachment feitos pelo Congresso contra ele. Interessante é que o artigo 134 foi incluído na Constituição em 1992 pelo então presidente Alberto Fujimoro, que tinha dissolvido o Congresso na época. Em 2019, o presidente Martín Vizcarra também dissolveria o Congresso. Algo comum no país andino.

No Brasil, o presidente do Senado pode abrir impeachment contra membros do STF e o da Câmara contra o presidente. Por isso, políticos bolsonaristas e até a ex-primeira dama, estavam na platéia torcendo por Marinho e de olho no Xandão. Mas deu ruim pra eles, foi praticamente uma segunda derrota de Bolsonaro para Lula.

Já o Congresso peruano, manipulado por uma extrema-direita fujimorista, aliada ao judiciário, grande mídia e militares, aproveitou a situação para depor e prender o representante eleito dos discriminados e empobrecidos indígenas e camponeses das províncias peruanas, deixando a vaga em aberto para a vice presidente Dina Boularte, considerada traidora por boa parte da população. É o sexto presidente em 5 anos.

Diante disso, eclodiram gritos de revoltas e manifestações por todo o Peru, exigindo a renúncia de Boularte, seguida de novas eleições e uma nova Constituição. As manifestações pacíficas logo tornaram-se alvos de uma repressão brutal das forças policiais, deixando dezenas de mortos por balas e torturas letais. Essa violência e sintomas de ditadura levaram alguns países a não reconhecer o governo de Boularte e junto com órgãos internacionais passaram a exigir a imediata renúncia dela e novas eleições.

Brasil e Peru demonstram que as elites latino-americanas não têm pudor em flertar com o fascismo e usam a democracia como fachada na defesa de seus interesses.

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Ricardo Azambuja
Ricardo Azambujahttps://realnews.com.br/author/rica/
Jornalista e bancário, formado em Economia na UFSC, com pós-graduação em Ecologia e Cinema. Trabalhou como repórter, redator e subeditor de Variedades no jornal Diário Catarinense e escreveu matérias sobre politica para o blog O Cafezinho

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