Foto: Luiz Erbes/AGIF/Gazeta Press
O futebol tem algumas particularidades que a lógica humana não consegue explicar.
Mas, mais do que isso, o futebol é um dos poucos casos em que pessoas que nunca chutaram uma bola profissionalmente ou, às vezes, nem sequer estudaram o esporte, suas práticas e suas táticas, têm soluções mágicas para resolver o problema de uma equipe ou de uma posição. Soluções essas que até mesmo profissionais com 40 anos de experiência na área, que vivem em clubes desde a infância, têm dificuldade em encontrar.
Logicamente, não é uma regra que as pessoas só possam falar sobre futebol caso tenham experiência profissional ou sejam ex-atletas. Se fosse assim, Carlos Alberto Parreira jamais teria sido multicampeão por clubes e campeão do mundo em 1994. Minha crítica aqui não é à opinião, mas sim à forma como o péssimo pode virar ótimo em questão de semanas, na visão coletiva do futebol.
Vamos a um caso claro disso:
Tiago Volpi. Antes mesmo de desembarcar em Porto Alegre, ele foi “cancelado” (para usar um termo atual) pelos torcedores e por grande parte da mídia gaúcha.
Mas por quê?
Volpi começou sua carreira em Porto Alegre, no São José, até chegar ao São Paulo para substituir ninguém menos que o maior jogador da história do Tricolor Paulista: Rogério Ceni.
Naturalmente, a comparação foi inevitável, o que afetou suas atuações. Ele deixou o clube com uma imagem muito negativa e seguiu sua carreira no México. Lá, segundo André Jardine, atual técnico do América, maior clube do país, ele evoluiu muito como goleiro.
Na última temporada antes de retornar ao Brasil, Volpi sofreu 29 gols em 25 partidas pelo Toluca, média de 1,16 por jogo. Para efeito de comparação, Marchesín deixou o Grêmio com uma média de 1,04 gols sofridos por jogo. Na temporada 2023/24, Volpi ainda marcou 10 gols de pênalti pelo Toluca (dados do GE.com).
Aliás, ele está no top 10 dos maiores pegadores de pênalti da história. Tem mais defesas de pênalti na carreira do que Marcos, ex-Palmeiras e campeão mundial em 2002, e está a apenas uma defesa de igualar Gianluigi Buffon, um dos maiores goleiros da história do futebol italiano.
Ainda assim, Volpi foi duramente criticado em sua chegada ao Grêmio, sem sequer ter tempo de mostrar suas qualidades ou sua evolução como profissional.
E é aí que entra o que a lógica humana não explica…
Copa do Brasil, Roraima. O Grêmio fez um péssimo jogo, mas, graças à atuação de Tiago Volpi, conseguiu uma classificação “heróica”, defendendo pênaltis e até marcando um gol na disputa. Uma classificação que rendeu mais de R$ 1 milhão ao clube e evitou um vexame histórico.
Ontem, na semifinal do Gauchão, quem garantiu a vaga do Grêmio na final?
Tiago Volpi.
Defendeu pênaltis, marcou de pênalti e liderou o time em um jogo eletrizante contra o Juventude, no Alfredo Jaconi.
A maioria dos torcedores sequer queria que ele desembarcasse em Porto Alegre. Diziam que era insuficiente, que não tinha “tamanho” para ser goleiro do clube.
Agora, ele está sendo venerado e citado como um goleiro decisivo nos momentos difíceis do time.
Acredite: nem eu nem você entendemos de futebol. Na verdade, ninguém entende. O máximo que temos é opinião.
O que penso é que precisamos ter cuidado para que nossa opinião não seja carregada de preferências pessoais baseadas na ignorância, queimando jogadores (principalmente os da base) e alimentando uma cultura de insuficiência.
Sempre me lembro do caso de Jonas, o “Mestre Jonas”. Saiu do Grêmio pela porta dos fundos, foi xingado, e se tornou um dos maiores jogadores da história de um clube gigante da Europa: o Benfica.
E isso é tão real que, às vezes, quem veneramos é justamente quem mais nos decepciona. Ou já esqueceram do Douglas Costa?
Enfim, a lógica humana não explica o futebol. O que é péssimo hoje pode ser ótimo amanhã, e vice-versa. Se futebol fosse simples, todo mundo estaria milionário dando mentoria para quem tem 40 anos de experiência em clubes.
E sabe o que é mais maluco?
Quem está elogiando hoje são os mesmos que criticaram ontem.
A lógica humana não explica isso.
