LUTO ANTECIPATÓRIO: A PREPARAÇÃO PARA A MORTE

O luto antecipatório é uma vivência de enlutamento que ocorre antes do paciente vir a falecer, ou seja, é o processo de luto anterior à morte propriamente dita (MOON, 2015). O conceito foi introduzido pelo psiquiatra alemão Erich Lindemann em 1944. Em seu estudo, o autor descreve a observação que fez em esposas de soldados recrutados para a Segunda Guerra Mundial. Estes, quando retornavam vivos para casa, tinham dificuldades de inclusão ao seu núcleo familiar, pois suas esposas haviam realizado um processo de elaboração de sua morte como se, de fato, esta tivesse realmente acontecido.
Qual seria a explicação para esse fenômeno? O psiquiatra refere que o luto antecipatório ocorre não em função da morte em si, mas da separação que ocorre devido a um evento que gera riscos de vida de modo a fazer com que o familiar tenha pressentimentos negativos em relação ao seu ente e, assim, há o início do processo de enlutamento. Em 1969, a psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross elaborou uma tese sobre as fases do luto. Em seu estudo, ela destaca que a vivência de luto antecipatório também ocorre em pacientes que estão em terminalidade de vida, ou seja, em cuidados paliativos. Dessa forma, os cuidadores, os profissionais e, inclusive, o próprio paciente podem vivenciar o luto antecipatório. Este fenômeno é uma vivência que ocorre devido
ao diagnóstico e ao prognóstico do paciente, sendo o câncer a doença mais associada a ele.
A vivência de luto antecipatório, assim como o luto normal, pode ser tornar psicopatológica, gerando estresse, tristeza, dificuldades de planejar o futuro, ideação suicida, além disso, pode dificultar a resolução de problemas e a tomada de decisão dos cuidadores frente aos cuidados prestados para o paciente. Por isso, é importante a realização da avaliação psicológica para cuidadores que prestam cuidados paliativos para que seja possível identificar sofrimentos emocionais advindos dessa vivência bem como a realização de um acompanhamento psicológico. Dessa forma, é possível uma intervenção de psicoterapia de luto antecipatório de acordo com a demanda dos familiares, equipe de saúde e cuidadores que acompanham o enfermo com objetivo de desenvolver estratégias de enfretamento adequadas, compreensões acerca do funcionamento psicodinâmico e encaminhamentos necessários.

Vale ressaltar que o luto antecipatório é um fenômeno complexo, pois os fatores envolvidos não são apenas biológicos e psicológicos, mas, também, sociais e espirituais. Por isso, indica-se uma psicoterapia que tenha a interdisciplinaridade como sustentação para que seja possível englobar os diversos âmbitos que influenciam na vivência de luto antecipatório. Assim, o suporte e os manejos adequados podem ser oferecidos para os familiares, profissionais da saúde e cuidadores para que seja possível lidarem de maneira saudável frente à terminalidade de vida daquele com quem tem vínculo.

Sobre o autor.        

 
Jorge Ondere Neto
Psicólogo – PUCRS.
Mestre em Psicologia Clínica – PUCRS.
Especialização em andamento em Avaliação Psicológica – Núcleo Médico Psicólogico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1MOON, P. J. Anticipatory grief: a mere concept? American Journal Hospital Palliative Care, pp. 1-4, 2015.
2LINDEMANN, E. Symptomatology and management of acute grief. American Journal of Psychiatry, vol. 101, pp. 141-148, 1944.
3KÜBLER-ROSS, E. (2008). Sobre a morte e o morrer. Martins Fontes: São Paulo, 2008. 304 p.
4ONDERE NETO, J.; DE MACEDO LISBO, C. S. Doenças Associadas ao Luto Antecipatório: Uma Revisão da Literatura. Psicologia: Saúde e Doença, vol. 18, n. 2, pp. 308-321, 2017.
5ANNGELA-COLE, L.; BUSCH, M. Stress and Grief Among Family Caregivers of Older Adults With Cancer: A Multicultural Comparison From Hawai‘i. Journal of Social Work in End-of-Life & Palliative Care, vol. 7, n. 4, pp. 318-337, 2011.
6OLSON, R. E. (2014). Indefinite Loss: the experiences of carers of a spouse with cancer. European Journal of Cancer Care, vol. 23, pp. 553-561, 2014.
7PETEET, J. R.; MAYTAL, G.; ROKNI, H. Unimaginable Loss: Contingent Suicidal Ideation in Family Members of Oncology Patients. Psychosomatics, vol. 51, n. 2, pp. 166-170, 2010.
8FOWLER, N. R.; HANSEN, A. S.; BARNATO, A. E.; GARAND, L. Association between anticipatory grief and problem solving among family caregivers of persons with cognitive impairment. Journal of Aging and Health, vol. 25, n. 3, pp. 493-509, 2013.
9FRANCO, M. H. P.; POLIDO, K. K. Luto antecipatório em cuidados paliativos. In: FRANCO, M. H. P. Atendimento psicoterapêutico no luto. São Paulo: Zagodoni, 2014. p. 26-35.
10FONSECA, J. P. Luto antecipatório. Rio de Janeiro: Livro Pleno, 2004. 184 p.

 

 

 

 

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