Fiz o exame. O laudo apontou epilepsia focal. Até então, meu quadro era tratado como “epilepsia comum”: começava com uma dor absurda no estômago e terminava em convulsão. Dor, medo, perda de controle — tudo isso eu já conhecia. O que eu não conhecia era o descaso que viria depois.
O neurologista do Vila Nova olhou o exame e, em poucos minutos, receitou dois medicamentos. Um deles eu já fazia uso. O outro, o ácido valproico, me causou um inchaço intenso, visível, constrangedor e doloroso. Não houve exame clínico detalhado. Não houve explicação. Não houve sequer um dia de retorno marcado. Apenas uma receita e o peso das consequências jogado sobre mim.
Hoje, além de lidar com uma condição neurológica séria, convivo com a vergonha. Vergonha de postar uma foto e ser julgada. Vergonha de imaginar o pensamento alheio, porque no Brasil a ignorância costuma ser rápida e cruel: “essa come por dois”, “se largou”, “relaxou”. Não. É efeito colateral. É medicamento. É um corpo reagindo a algo que deveria ser acompanhado por um profissional.
O problema não é apenas o remédio. É a forma como ele foi imposto. É a ausência de acompanhamento. É o silêncio depois da consulta. Epilepsia não é detalhe. Não é algo que se resolve com pressa, sem escuta, sem empatia.
Cada organismo reage de um jeito, e isso deveria ser o básico da medicina. Estou cansada. Cansada de me sentir frustrada, inchada, invisível e desamparada por causa de um neurologista que não examinou, não orientou e não acompanhou.
Cansada de carregar no corpo as marcas de uma decisão médica mal conduzida. O diagnóstico eu aceito. O descaso, não.
Vou colocar o exame abaixo, não por exposição, mas por transparência. Porque falar sobre isso também é uma forma de resistência. E porque pacientes não podem continuar pagando, com o próprio corpo, o preço da incompetência profissional.

Ainda por cima de tudo, vem a vergonha
É doloroso sair para comprar roupa e perceber que é caro, feio e, no fim, não leva nada. A autoestima já está frágil, o corpo não responde como antes, e a sensação é de exclusão.
Achei uma blusa linda na Shopee para usar no Ano Novo. Nem sei se serviria — porque simplesmente não chegou. Frustrada e cansada, tive que pedir reembolso. Não era só uma compra: era uma tentativa de me sentir um pouco melhor em meio a tanta coisa difícil.
O pior é não saber a quem culpar. A loja parceira da Shopee? A logística? A própria plataforma? Desabafei com a vendedora, que se mostrou empática, humana. Mas hoje, refletindo com mais calma, não sei se era empatia real ou apenas parte do jogo.
Escrevo aqui como pedido sincero: se alguém conhecer neurologista do SUS, algum caminho possível, algum contato humano que ajude de verdade, eu preciso dessa ponte agora. Epilepsia não espera. Dor não espera. Cansaço emocional também não.
Peço ajuda. Com respeito, com verdade e com urgência.
Epilepsia focal: quando a crise começa em silêncio no cérebro
Diferente da imagem mais conhecida da epilepsia, marcada por convulsões generalizadas e perda de consciência.
A epilepsia focal muitas vezes passa despercebida. Esse tipo de epilepsia tem início em uma região específica do cérebro e pode se manifestar de formas sutis, confundidas com ansiedade, mal-estar ou até desatenção.
Segundo especialistas, nas crises focais a pessoa pode permanecer consciente, apresentando apenas tremores localizados, sensações estranhas, alterações visuais ou auditivas, náusea repentina ou sentimentos intensos de medo e déjà vu. Em outros casos, há alteração da consciência: o indivíduo parece “desligado”, não responde adequadamente e realiza movimentos automáticos, como mastigar ou mexer as mãos.
A neurologia explica que essas crises refletem a função da área cerebral afetada. Quando a descarga elétrica ocorre em regiões motoras, os sintomas são físicos; quando atinge áreas sensoriais ou emocionais, as manifestações podem ser subjetivas e difíceis de relatar. Isso contribui para o subdiagnóstico da epilepsia focal, especialmente em adultos.
As causas variam. Podem estar relacionadas a lesões cerebrais, sequelas de AVC, tumores, infecções ou malformações congênitas. Em parte dos casos, no entanto, a origem permanece desconhecida.
O diagnóstico envolve avaliação clínica detalhada, eletroencefalograma (EEG) e exames de imagem, como a ressonância magnética.
O tratamento é feito principalmente com medicamentos anticonvulsivantes, ajustados de forma individual. Quando as crises não respondem à medicação, outras abordagens podem ser consideradas, como cirurgia ou terapias de estimulação neurológica.
Apesar de controlável na maioria dos casos, a epilepsia focal ainda enfrenta preconceito e falta de informação.
Especialistas alertam que reconhecer os sinais precoces e buscar acompanhamento médico é fundamental para garantir qualidade de vida e reduzir riscos. Afinal, nem toda crise convulsiva é visível. Algumas começam em silêncio, dentro do cérebro, e só podem ser ouvidas quando a informação chega à sociedade.



