Cachoeirinha conseguiu, mais uma vez, fazer aquilo que administrações ruins fazem com eficiência: transformar o cotidiano do cidadão em um teste de resistência.
A Transbus anunciou uma medida “drástica e indesejada”: a partir deste sábado, 13 de dezembro de 2025, os ônibus deixam de circular todos os dias entre 8h e 15h, até que a Prefeitura regularize os repasses do subsídio tarifário. Pico da manhã e da tarde e transporte escolar ficam mantidos.
E repare: o texto da empresa não tem pudor em apontar o dedo. Diz, com todas as letras, que a responsabilidade é “exclusiva do Poder Concedente”, isto é, a Prefeitura. A razão: interrupção dos pagamentos do subsídio previsto em lei — o mecanismo que sustenta o “equilíbrio econômico” do sistema.
O que isso significa, em português claro? Significa que o morador que trabalha, estuda, pega consulta, corre atrás da vida — esse morador vira refém de um conflito que não é dele. A cidade para no meio do dia. E o cidadão que se vire. Porque, na prática, “parcialmente paralisado” é o nome elegante para “boa sorte”.
O enredo é conhecido: a conta chega — e chega no colo do povo
Subsídio não é palavrão. É instrumento de política pública. Se existe lei e modelo contratual que pressupõem repasse, interromper pagamento é brincar com dinamite. E dinamite, como se sabe, não explode no gabinete: explode no ponto de ônibus.
A Transbus diz que precisa cortar para minimizar custos e garantir salário. Quando a conversa chega nesse ponto, já não é só crise de gestão: é crise social.
Agora vem a pergunta que não quer calar:
Se o sistema depende do subsídio para funcionar (como a própria estrutura legal indica), quem deixou a engrenagem travar? E por quê?
E aí entra o contexto político: a prefeitura na corda bamba
O caso do transporte não aparece no vácuo. Ele cai como uma luva — ou como uma pá — num momento em que o prefeito Cristian enfrenta processo de cassação em andamento na Câmara. A própria Câmara registrou a abertura de um novo processo de impeachment em outubro de 2025. cmcachoeirinha.rs.gov.br
E, no mesmo 13 de dezembro, saiu decisão judicial restabelecendo o andamento do chamado “Impeachment 2”, com um recado central: cabe à Câmara apurar e julgar, e o Judiciário atua no controle de legalidade, não para “trancar” o processo por conveniência. Seguinte
Convém sublinhar: processo não é condenação. Cassação “consumada” não é a mesma coisa que cassação “em curso”. Mas, politicamente, é ainda mais devastador: porque, enquanto se discute a sobrevivência do mandato, a cidade discute a sobrevivência do seu dia a dia.
Cachoeirinha, outra vez, no noticiário das mazelas
Há cidades que viram notícia por inovação, qualidade de vida, eficiência. E há as que viram notícia por aquilo que elas não conseguem fazer: o básico.
Transporte público é o básico. Não é “projeto”. Não é “branding”. Não é vídeo de rede social. É gente chegando no trabalho.
Quando a prefeitura deixa o sistema chegar ao ponto de cortar ônibus das 8h às 15h, o que está sendo interrompido não é só uma linha: é a dignidade logística de quem depende do coletivo.
E, nesse cenário, o prefeito Cristian — acuado por processo político — aparece como símbolo do que Cachoeirinha não aguenta mais: administração que entrega turbulência, empurra problema e, quando a conta estoura, tenta terceirizar a culpa.
Cachoeirinha merece sair do modo “vergonha recorrente”. E isso não acontece com nota protocolar, nem com empurra-empurra institucional.
A cidade precisa do que falta há tempos: governo que governe. E Câmara que cobre. Porque, do contrário, o noticiário continuará sendo esse: um município inteiro refém da própria má gestão — e um cidadão pagando, em tempo e em humilhação, a tarifa mais cara de todas: a da incompetência.
Foto: Andre Guterrez



