No julgamento que trata da articulação golpista contra o resultado das eleições, os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino votaram pela condenação de todos os acusados, mas discordaram quanto à relevância da conduta de três deles: o general da reserva Paulo Sérgio Nogueira, ex-titular da Defesa; o general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional; e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que comandou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Dino acompanhou o relator ao reconhecer a culpa dos oito réus, mas defendeu penas mais brandas para esse grupo específico.
— É inequívoco que há diferentes patamares de culpabilidade. Não se trata de divergência, mas de uma distinção em relação ao ilustre relator. Bolsonaro e Braga Netto exerceram papel central. Já Paulo Sérgio, Augusto Heleno e Alexandre Ramagem tiveram participação de menor envergadura — afirmou o ministro.
Provas indicam “menor impacto causal”
Na avaliação de Dino, as evidências apontam que esses três réus tiveram influência reduzida na engrenagem conspiratória. No caso de Ramagem, ele destacou que a saída do então diretor da Abin ocorreu em março de 2022 e não há registros de que tenha participado diretamente das reuniões que antecederam os episódios de 8 de janeiro.
— Seus atos executórios cessaram em março de 2022. Não identifiquei movimentações após o pleito, o que diminui sua eficiência causal — declarou.
Sobre Augusto Heleno, Dino disse não ter localizado elementos que indiquem atuação concreta no segundo semestre de 2022, fase considerada crucial para a tentativa de ruptura. Com ironia, recordou o costume do general de entoar músicas contra o Centrão, mas frisou que tal comportamento não se traduziu em ações relevantes para o processo.
— Felizmente, ele não cantou nos autos. Não percebi envolvimento em reuniões posteriores, o que demonstra um papel secundário — comentou.
Quanto a Paulo Sérgio, Dino ponderou que, apesar de sua presença em determinados atos, houve tentativas de demover Bolsonaro da adoção de medidas de exceção.
— Houve contribuição até certo ponto, mas também um esforço de dissuasão, o que deve ser considerado na fixação da pena — concluiu.
Moraes defende responsabilidade uniforme
O relator Alexandre de Moraes, por outro lado, rejeitou qualquer distinção entre os acusados. Para ele, todos os oito exerceram funções estratégicas na tentativa de ruptura institucional. Moraes lembrou que a chamada “minuta golpista” foi discutida entre a cúpula militar e autoridades do governo, configurando articulação coletiva.
— As responsabilidades estão claramente demonstradas pela organização de atos violentos e pela tentativa de conferir aparência de legalidade a um golpe de Estado. Não é admissível relativizar a conduta de quem ocupava cargos de comando — afirmou.
Efeitos na dosimetria
A divergência pode ter impacto direto na fixação das penas. Dino já sinalizou que aplicará o artigo 29 do Código Penal, que prevê redução para réus cuja participação seja considerada de menor importância. Se prevalecer a posição do relator, entretanto, todos receberão punições semelhantes, ainda que proporcionais ao enquadramento jurídico de cada crime.
O julgamento prossegue nesta semana com a conclusão dos votos e a manifestação dos demais ministros da Primeira Turma. A expectativa é que a decisão estabeleça não apenas a condenação, mas também critérios de dosimetria que servirão como referência para os demais processos relativos aos eventos de 8 de janeiro.
Foto: Rosinei Coutinho/STF